AS FOTOGRAFIAS COMO MEMÓRIAS VIVAS DO AMOR



Rodrigo Vasconcelos Machado
(Doutor/UFPR)

RESUMO: Nosso objetivo é propor uma leitura do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, à luz das lembranças e das distorções causadas em Bentinho pelas fotografias que compõem seu álbum de recordações. As fotos de que dispõe o narrador configuram-se como memória para recordar um amor mumificado, e a compreensão dos fatos pelo narrador é diretamente tangenciada pela visão distorcida que ele tenta passar a partir do enfoque que diretamente dá às suas lembranças. Apoiamo-nos, para isso, nas teorizações de Barthes sobre a fotografia, bem como na fortuna crítica machadiana representada pelos seus principais nomes.

Palavras-chave: Fotografia, memória, distorção.


Quanto a mim, se fosse convidado a representar o Amor, creio que o pintaria sob a forma de um cavalo enfurecido que devora seu dono, ou então de um demônio com olheiras devido à devassidão e à insônia, que se arrasta, como um espectro ou um condenado, com correntes estridentes nos calcanhares, segurando numa das mãos um frasco de veneno e na outra o punhal ensanguentado do crime. 
Baudelaire, Obras completas, p.818.

R: Que lembranças ainda a surpreendem?—Sinto saudades de Salvador, sonho frequentemente com ele, embora sejam tantos anos de solidão. Mas é muito importante, a lembrança, a memória, minhas fotos, essas que não me devolvem. Tenho direito a elas, e isso me importa muito mais do que todos os bens materiais que perdemos. 
Entrevista com Hortensia Bussi de Allende, viúva de Salvador Allende, revista República, março de 1998.

Não lhe arranquei mais nada. Os outros todos como se houvessem passado palavra, repetiam a mesma cantilena. Talvez esse discreto silêncio sobre os textos roídos fosse ainda um modo de roer o roído. 
Machado de Assis, Dom Casmurro, p.827. 


As fotografias da memória em Dom Casmurro, de Machado de Assis, são o registro da morte do amor. Ao evocar o seu passado, o narrador Bentinho, se vale em várias partes de fotos e/ou retratos que compõem o seu álbum de recordações. O instante fugaz captado pela objetiva/pena de Bentinho ocorre uma só vez, só que a cada nova leitura novas possibilidades de interpretação surgirão. Podemos dizer, num primeiro momento, que o uso de fotos apoia como documento o “processo de retórica” (SANTIAGO, 1978, p. 29) montado pelo gentleman Dom Casmurro contra Capitu. Bentinho metaforicamente coloca sua história no “leito de Procusto”[1], isto é, ele literalmente deita a sua “vítima” no leito do bandido com alguns “cortes e/ou estiramentos” para que ela fique confortavelmente instalada. Esta analogia nos permite colocar que por detrás deste narrador existe outro conduzindo a narrativa e que durante a narrativa vai mostrar a “pequenez” de Bentinho e dos demais personagens. Ademais, é interessante observar que quando o narrador 1 relata a sua versão dos fatos ocorridos, temos vários “deslizes” que comprometem o seu “processo de retórica” e a sua tentativa durante todo o romance de acusar Capitu de traição e que se casa perfeitamente com a atitude do bandido Procusto, que é, a saber, nas palavras de Jean Chevalier, o de:

(...) reduzir qualquer um que passasse em seu porte as dimensões desejadas. É um símbolo perfeito da banalização, da redução da alma a uma medida convencional (lembre-se da mediocridade de Bentinho). É a perversão do ideal em conformismo. É um símbolo da tirania ética e intelectual praticada pelas pessoas que não toleram as ações e os julgamentos de outrem a não ser que se conformem com seus próprios critérios[2] (O grifo é meu).

 O uso de fotos compromete seriamente a argumentação de Bentinho, na medida em que a construção da história se faz pelo trabalho da linguagem que resultam em imagens distorcidas pelo narrador 1. Já na fotografia temos um referente que adere. Esta junção do referente na foto foi teorizada por Roland Barthes no seu livro A câmara clara: notas sobre a fotografia. Segundo este escritor, a fotografia diz “isso é isso, é tal” (BARTHES, 1984, p.14). A imagem final é aquilo que ela representa e que não fala “daquilo que não é mais”, mas apenas e com certeza “daquilo que foi” (BARTHES, 1984, 127). Ao contrário da busca do tempo perdido proustiana, a fotografia ratifica o que ela representa, pois é uma emanação de um corpo, captada através dos sais de prata, que traz no seu bojo o “poder de autentificação” que se sobrepõe ao “poder de representação” (BARTHES, 1984, p.132). A colocação anterior é corroborada pela seguinte asserção de Silviano Santiago:

Daqui advém sem dúvida a grande diferença — não muito respeitada pela crítica brasileira — entre o narrador Dom Casmurro e o de Em busca do tempo perdido, na medida em que, no caso de Machado, a reconstrução obedece a desígnios apriorísticos, óbvios ou camuflados, mas sempre sob o devido controle daquele que lembra, que escreve e que sabe onde está o meio do livro, ao passo que no caso de Proust o passado lhe surge como um presente, gratuito e inesperado, que lhe é oferecido pelo exercício apurado dos seus sentidos.[3]

            Retomando as ideias mencionadas anteriormente, podemos inferir que a “fotomontagem” que o narrador 1 realiza no corpo da narrativa é outro aspecto que põe em xeque os seus argumentos, pois este se vale de uma “representação” no plano da linguagem e não existe em todo o romance nenhuma fotografia, apenas texto.
A construção da tessitura narrativa de Dom Casmurro está coalhada de referências fotográficas narradas no plano da linguagem que ao ganharem o olhar de Bentinho são animadas[4]. Talvez para este narrador 1, determinadas fotos tivessem uma significação especial, mas para outro observador passassem desapercebidas. Por que este fato acontece? Barthes estabelece que num primeiro instante em que uma pessoa entra em contato com uma foto seria o “studium”, termo do latim que designa estudo, não no sentido estrito do termo, mas sim como “aplicação a uma coisa, o gosto por alguém, uma espécie de investimento geral, ardoroso, é verdade, mas sem acuidade particular.” (BARTHES, 1984, p.45).   Para opor ao “studium”, Barthes sugere que certas fotos tem o poder de “picar”, de “pungir”, ou seja, a fotografia como ferida, como punctum, que atesta o fim do amor que ela congelou num instante fugaz, porque quando eu e/ou nós a animo (amos) ela me (nos) fere, porque acrescento (amos) um suplemento pessoal que a distorce ou não, pois, como assevera Barthes, “(...) o punctum de uma foto é esse acaso que, nela, me punge (mas também me mortifica, me fere).”[5] A fotografia como que embalsama aquilo que está diante da objetiva, uma vez que  confere  ao sujeito o sentir-se como um objeto, que seria uma micro experiência da morte.         
  A sugestão de pensar o romance Dom Casmurro como uma espécie de “álbum de fotografias” foi levantada no ensaio “Da morte do amor,” de Lauro Belchior Mendes (MENDES, 1996, p.40). Este ensaio faz parte de um estudo que discute a relação entre literatura e vida a partir de uma citação de José Lezama Lima sobre a questão do Banquete. Além de Machado de Assis, Lauro Belchior Mendes discute esta questão com outros textos da Literatura Brasileira, como Amar, verbo intransitivo, de Mário de Andrade e Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa. O autor ressalta a importância do “Banquete antropofágico” que os textos mencionados anteriormente realizam com outros textos da tradição literária do ocidente. No caso específico da obra machadiana, o crítico mineiro explicita a proposição de que o cuidado de Machado de Assis com a sua obra contribuiu para fundar uma tradição, daí o título geral da obra de Lauro Belchior Mendes, A Expressão Brasileira: Narrações Exemplares, e o objetivo deste autor seria o de “(...) determinar uma outra vertente dessa expressão (a expressão brasileira) que, embora continue sendo uma forma de nacionalismo literário, vai por outros caminhos em busca do encontro de nossas marcas culturais específicas.”[6]
 No ensaio sobredito, o autor incialmente chama atenção para o cuidado que Machado de Assis tinha com o acabamento dos seus livros. Além da qualidade estética interna de sua obra, a fatura externa recebeu os mesmos desvelos por parte do romancista.  Esta dupla preocupação do autor repercute indiretamente na orquestração da matéria narrada, uma vez que ele se preocupa com o acabamento final da obra, como atesta Lauro Belchior Mendes ao analisar o corte de um episódio a respeito de Capitu, que segundo este crítico “poderia comprometer toda a obra, caso fosse conservada.” (MENDES, 1996, p. 30). A passagem que Lauro Belchior Mendes nos chama a atenção é uma fala do agregado José Dias:

(...) — Pode ser minha senhora, mas não falei senão depois de muito examinar: V. Ex. e o digno coronel estão de boa fé. Conheço o pai da pequena; é um velhaco. A filha não é menos velhaca, apesar de desmiolada. Enfim, cumpro um dever amargo, um dever amaríssimo. (Um agregado, grifo de Lauro Belchior Mendes). Compare-se com a mesma passagem em Dom Casmurro: — Pode ser minha senhora. Oxalá tenha razão; mas creia que não falei senão depois de muito examinar...[7] 

            O eixo de construção do romance de Machado de Assis seria o “álbum de retratos” de uma tragédia doméstica que gira em torno de um “quatrilho”. O narrador Dom Casmurro repassa na fase adulta o seu romance com Capitu e sua posterior desilusão. No conjunto da obra existem indícios que imputam a culpa a Capitu ou não. Dentro da composição da narrativa entram diversos retratos que são detalhadamente descritos pelo narrador 1. Cada retrato e/ou foto é o punctum que mortifica Bentinho, pois traçam a evolução do seu amor e o “mumificam”. A maneira de uma fotomontagem, coisa impensada para a época em que viveu Machado de Assis, pois está técnica artística de composição estava em seus primórdios, o narrador 1 vai compondo e montando a sua versão dos fatos, apesar de a fotografia ser um recorte da realidade, esta é desviada para a categoria do verossímil e que enforma a “retórica da verossimilhança” (SANTIAGO, 1978, p.29).
            A “retórica da verossimilhança” é o título do ensaio de Silviano Santiago sobre Dom Casmurro. A leitura deste crítico tangencia em alguns pontos as colocações de Lauro Belchior Mendes, principalmente na questão dos dois narradores. Para Silviano Santiago, o narrador Bentinho tem duas faculdades que o auxiliam em seu processo argumentativo. A primeira é a questão de ser um advogado que está ciente de como processar um libelo acusativo e a outra de ser um seminarista, isto é, tinha o domínio da arte retórica e sabia executar os procedimentos processuais. Outro detalhe pertinente que cita este autor é de que durante toda a narrativa, o narrador 1 se refere ao ato de escrever. Já para Lauro Belchior Mendes, existe um narrador que se oculta por detrás de Bento Santiago e que vai montar um texto nas entre linhas e que em muitos aspectos desmente a versão dos fatos apresentados pelo advogado Casmurro. Este dissimular nas “aparências enganosas” nos é colocado pelo ensaísta da seguinte maneira:

Apenas na aparência: porque na verdade, há como que um comentário ou análise desse outro narrador, que estou chamando de segundo, que sempre desvenda a mesquinhez e o pequeno horizonte intelectual da personagem: o segundo narrador comanda a (foto) montagem do livro como um todo, como maestro de uma grande orquestra ao executar uma grande obra.[8] (O acréscimo é meu)

            Há referências metalinguísticas em Dom Casmurro que vão de encontro a proposição anterior, como no caso da definição de ópera do tenor italiano Marcolini que antecipa qual vai ser o espetáculo que será descortinado para o leitor:

 —A vida é uma ópera e uma grande ópera. O tenor e o barítono lutam pelo soprano, em presença do baixo e dos comprimários, quando não são o soprano e o contralto que lutam e pelo tenor, em presença do mesmo baixo e dos mesmos comprimários. Há coros numerosos, muitos bailados, e a orquestração é excelente...[9] (O grifo é meu)

            No trecho acima, podemos deduzir que a excelente orquestração da matéria narrada é realizada pelo narrador 2 ao colocar subentendido a mediocridade do narrador Bentinho.
                A relação amorosa com o objeto de análise também influencia a escrita de seu crítico. Se em Dom Casmurro podemos observar em vários trechos referências a outros textos da tradição literária do ocidente, no ensaio Da morte do amor elas também se fazem presentes. Ao pautar a sua investigação pelo desvelamento da significação e funcionalidade da fotografia na urdidura da trama narrativa, Lauro Belchior Mendes nos apresenta uma nova proposta de leitura que se alimenta de outras, como a de Roberto Schwarz, por exemplo, e levanta novas questões, como ao descodificar alguns dos procedimentos narrativos de Machado de Assis, o autor lança mão de estratégias intertextuais comparativas, além de ter como centro de seu estudo a preocupação com a armação da escrita meticulosa que se aproxima do cuidado de Machado de Assis pelos seus textos.
            Antes de seguirmos com esta análise, convém salientar alguns pontos das leituras de Roberto Schwarz sobre a obra machadiana. Em primeiro lugar, devemos ressaltar o papel que teve este crítico para a crítica literária brasileira quando descortinou a relação entre literatura e sociedade presentes nos romances de Machado de Assis. Através de uma interpretação marxista do seu objeto de estudo, Roberto Schwarz problematizou a questão do local e global que rotulava as narrativas machadianas como alienadas de sua realidade social. Esta visão de Machado de Assis como o burguês da Rua do Ouvidor condecorado pela princesa Isabel com a ordem da Rosa, que irritou muitos zoilos da “nova geração”, vem desde os tempos de Silvio Romero, com o seu Machado de Assis: Estudo comparativo de Literatura Brasileira, em que a obra machadiana é comparada desfavoravelmente com a de Tobias Barreto. Até mesmo Mário de Andrade, depois da execução dos dois italianos nos Estados Unidos e sua desilusão com o movimento da semana de 22, estava desencantado com Machado de Assis[10]. Um dos críticos pioneiros, que “colocou Machado de Assis no seu devido lugar” (parafraseando a Silvio Romero) foi Brito Broca com o livro Machado de Assis a política e outros estudos[11]. Nesta obra, o autor destaca o envolvimento de Machado de Assis em algumas das convulsões políticas do seu tempo, como a abolição da escravidão e a queda da monarquia onde a atuação pública de Machado de Assis é radicalmente diferente do papel passivo do narrador Conselheiro Aires no Memorial de Aires. Temos de citar obrigatoriamente os trabalhos de Augusto Meyer, Astrojildo Pereira e Lucia Miguel Pereira[12] que contribuíram decisivamente para lançar novas luzes nos estudos machadianos. Após esta digressão é hora de voltarmos ao nosso caminho, mas é sempre bom destacar o papel da tradição da crítica brasileira, que começando com Machado de Assis, oferece e possibilita subsídios teóricos para a confrontação com os modismos importados. As reflexões de Lauro Belchior Mendes e de Roberto Schwarz coadunam com a tese levantada anteriormente, na medida em que estão enformadas por considerações críticas reveladoras de um percurso intelectual.
            Em seu ensaio “A poesia envenenada de Dom Casmurro”, Roberto Schwarz retoma algumas ideias desenvolvidas nos seus livros Ao vencedor as batatas e Um mestre na periferia do capitalismo. Inicialmente, Schwarz propõe que Dom Casmurro demanda três tipos de leituras “sucessivas”. A primeira consiste na história do nascimento e a posterior decomposição (ou putrefação) do amor que se aproxima bastante da definição de Charles Baudelaire que abre o meu texto. A segunda está enformada pela busca de evidências que comprovassem o adultério cometido por Capitu. Finalmente, a terceira, vai contra o narrador Bentinho que se transformou em Dom Casmurro, narrador este que tenta convencer a si mesmo e ao leitor da culpa de Capitu.
            Para Schwarz, os ciúmes do narrador 1 condensam toda uma problemática de ordem social e histórica. A forma seria o reflexo da sociedade da época, mas que está bastante avançada para o seu tempo e colocam o romance machadiano em pé de igualdade com Proust, Henry James e outros, principalmente no que se refere à técnica narrativa do distanciamento de Machado de Assis dos seus narradores.
            Em suma, a crítica de Schwarz está ancorada no desvelamento destes diversos “narradores” e de suas máscaras, a partir da sua inserção no contexto histórico-social. Este tipo de leitura é pertinente e permite elucidar alguns pontos que até então eram omitidos pela crítica. Devemos, contudo, salientar o perigo para o fechamento da leitura da obra. Num primeiro momento, temos uma explicação para o “enigma de Capitu” por uma inversão das posições, uma vez que quem está agora no banco dos réus é o narrador Bentinho com a sua poesia envenenada, que por si só suscita um questionamento do porque da crueldade deste narrador 1. Tal como a fênix, Capitu ressurge e cobra espaço na leitura de Schwarz como símbolo da individualidade feminina em um meio patriarcal, posição esta que tangencia bem de perto a revalorização do papel da mulher na sociedade do século XX, porém é importante assinalar que o julgamento de uma obra por critérios de outra época compromete o resultado e obnubila a crítica. Outro problema da crítica de Schwarz são os seus “deslizes” de mau gosto, como neste exemplo: “(...) - e teremos passado ao universo violento e boçal onde a vítima genérica é a honra da genitora alheia, uma humanidade composta de efes da pê.” (SCHWARZ, p.28).
            Observamos que a preocupação destes dois críticos com a questão de literatura e sociedade está atrelada ao trabalho desenvolvido pelo ensaísta Antonio Candido, principalmente na obra Formação da Literatura Brasileira. Na introdução que abre o segundo volume, Candido traz a lume o papel preponderante que Machado teve na Literatura Brasileira:

Em Machado, juntam-se por um momento os dois processos gerais da nossa literatura: a pesquisa dos valores espirituais, num plano universal, o conhecimento do homem e das sociedades locais. Um eixo vertical e um eixo horizontal, cujas coordenadas delimitam, para o grande romancista, um espaço não mais geográfico ou social, mas simplesmente humano, que os engloba e transcende.[13]      

Os estudos comentados antes trouxeram novos contributos para a fortuna critica sobre Machado de Assis. São leituras em que a “angústia da influência” se faz presente de uma maneira saudável. Os textos de Silviano Santiago e Lauro Belchior Mendes mostram como a obra de Machado de Assis permanece atual.
 Retomando as epígrafes que abrem este artigo, temos presente no ensaio Da morte do amor, a questão das fotografias como memórias vivas do amor, que pode ter a acepção que lhe atribui de crueldade, mas que não transmitem pessimismo e sim serenidade. Por outro lado, as fotos e retratos descritos são a memória que dispõe o narrador Bentinho para recordar a existência do amor fugaz mumificado num instante pela objetiva e que permanecerá sempre vivo a cada leitura que fizermos da obra. Talvez o fato de Bentinho ferido pela suposta traição de Capitu e mortificado pela lembrança tenha distorcido a sua compreensão dos fatos, uma vez que este sempre vivia num mundo da imaginação. Mundo este que é o campo fértil para a Literatura, porque a voz da ousadia é a própria imaginação que o ficcionista Machado de Assis teve de criar uma narrativa que instaurou a renovação do romance brasileiro e inaugurou uma tradição viva na Literatura Brasileira.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ANDRADE, Mário. Vida literária. São Paulo: Edusp/Hucitec, 1993.
ASSIS, Machado de. Dom Casmurro. In: Obras completas - volume 1. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. 
BARTHES, Roland. A câmara clara: notas sobre a fotografia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
BAUDELAIRE, Charles. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1995.
BROCA, Brito. Machado de Assis a política e outros estudos. São Paulo: Edusp, 1990.
BOSI, Alfredo. Machado de Assis. São Paulo: Ática, 1982.
CANDIDO, Antonio. Formação da Literatura Brasileira. Belo Horizonte: Itatiaia, 1993.
MENDES, Lauro Belchior. A Expressão Brasileira: Narrações exemplares. Belo Horizonte: NAPQ/FALE/UFMG, 1996.
SANTIAGO, Silviano. Uma Literatura nos Trópicos: Ensaios Sobre Dependência Cultural. São Paulo: Perspectiva, 1978.
SCHWARZ, Roberto. Duas meninas. São Paulo: Cia das Letras, 1997.





[1] In: CHEVALIER, J. Dicionário de símbolos, p. 744. 
[2] Idem, ibidem
[3] SANTIAGO, Retórica da verossimilhança, 1984, p. 38.
[4] A “animação” de uma foto é definida por Barthes do seguinte modo: “Nesse deserto lúgubre, me surge, de repente, tal foto; ela me anima e eu a animo, é assim que devo nomear a atração que a faz existir: uma animação.” In: BARTHES, 1984, p. 37
[5]ibidem,idem, p.46.
[6] Idem, Ibidem , p.9
[7] APUD. MENDES, 1996 , p. 30.
[8] Idem, p.34.
[9] MACHADO, Dom Casmurro, p. 817.
[10] O trecho que me reporto é o seguinte: “E aos artistas a que faltam esses dons de generosidade, a confiança na vida e no homem, a esperança, me parece impossível amar. A perfeição, a grandeza da arte é insuficiente para que um culto se totalize tomando as forças do crente. Sabes a diferença entre a fé católica e o livre exame protestante? A um Machado de Assis só se pode cultuar protestantemente. In: ANDRADE, Mário. Vida literária, 1993, p.53.
[11] BROCA, Brito. Machado de Assis a política e outros estudos. São Paulo, Edusp, 1990.
[12] MEYER, Augusto. Machado de Assis. Rio de Janeiro, Org. Simões, 1952 - PEREIRA, Astrojildo. Machado de Assis. Rio de Janeiro, Liv. São José, 1959; PEREIRA, Lucia Miguel. Prosa de ficção. Belo Horizonte, Itatiaia, 1978.
[13] CANDIDO, Formação da Literatura Brasileira, p.102.