Sociolinguistica: uma questão de cultura e valorização popular

Aline Patrícia Kovalski[1]

Resumo: Veremos nesse trabalho qual é a função da sociolingüística dentro do contexto sala de aula, e como é importante a valorização das variações lingüísticas trazidas na fala de nossos alunos, no intuito de melhorar as práticas pedagógicas utilizadas, amenizando o tradicionalismo imposto pela sociedade, que acaba bloqueando o desenvolvimento do aprendizado e a desenvoltura do ensino dentro das escolas.

Palavras chaves: Educação, ensino, aprendizagem e valorização.


Introdução

No intuito maior da escola em ensinar o português padrão, surgem várias dúvidas de como introduzi-lo no contexto de sala de aula, sem que isso se torne uma tarefa maçante a qual os alunos, muitas vezes, não têm muito interesse. Pelos problemas que encontramos em sala de aula, fica cada vez mais importante auxiliar os alunos, não somente com a programação escolar, mas, levando a eles a oportunidade de aprenderem com situações reais, com fatos cotidianos e que eles se identifiquem com temas próximos à realidade social a qual cresceram e vivem, num sistema capitalista repletos de produtos e acessórios para jovens, como por exemplo, xampus, cremes comida, bebida, brinquedos enfim, uma infinidade de atrativos expostos em propagandas, outdoors, revistas etc.

O mundo é repleto de textos e de gêneros textuais interessantes e que podem ser utilizados na elaboração de aulas produtivas e significativas, que tragam aos alunos oportunidades que a maioria das aulas, pelo menos de língua portuguesa, muitas vezes, não conseguem, ou se conseguem, não despertam o interesse de nossos jovens.

Mostrando a diferença que há entre escrita e fala, facilita o entendimento do motivo pelo qual aprendem língua portuguesa na escola. Cada vez mais a sociedade exige um conhecimento maior acerca de nossa língua e o primeiro passo pode ser dado para romper as barreiras que impedem o desenvolvimento de nossos jovens tanto educacional como socialmente.
As variações lingüísticas é a oportunidade mais próxima que os alunos podem ter com nosso contexto social, em um contexto de sala de aula associando a educação com cidadania, para aprenderem o português padrão exigido pela sociedade.


1 Visão geral sobre a sociolingüística no Brasil

Sabemos que no início da educação no Brasil, era privilégio de poucos, freqüentarem a escola, ter uma boa formação eram regalos apenas das pessoas de classe alta, ou seja, a Elite.
Com o passar dos anos, rotulou-se um método de ensino onde um padrão de linguagem era imposto, qualquer forma diferenciada desse padrão era considerado erro, ou pior, vulgar, onde os poucos que sabiam dessa norma eram os que comandavam grande parte da sociedade, assim, criou-se, também, um tabu entre o ensino/aprendizagem.

Os estudos sociolingüísticos nos mostram, hoje em dia, que o rótulo dos métodos tradicionais de ensino, deve ser rasgado o mais rápido possível, pois, disso depende o bom andamento do ensino e da aprendizagem nas escolas brasileiras.

Dizer que os alunos vão para a escola para aprender a falar corretamente a língua que lhes foi apresentada desde que nasceram, é um equívoco que deve ser restituído para se valorizar os alunos, como seres pensantes que são, como participantes nas atividades escolares e sociais, passando da passividade para a atividade.
Bagno (2002, p. 39) nos esclarece que:

Tentar preservar, impor e cobrar um padrão de comportamento lingüístico único, aristocrático e obsoleto é um projeto que se contrapõe de maneira gritante a toda essa dinâmica da sociedade, da cultura e da língua. Uma sociedade e cultura multifacetadas e plurais só podem abrigar uma língua multifacetada e plural.

Levantamos a questão da valorização, ainda hoje em dúvida, dessas variedades lingüísticas, no entanto, ressaltamos o dever não só do professor, mas também da sociedade em geral, de se valorizar essas várias culturas de nossas escolas.
Sabemos que os alunos trazem desde seu contexto familiar traços importantíssimos de culturas diferentes, seja por etnia, classe social, idade ou quaisquer outros motivos referentes à nossa criação como pessoa de uma sociedade. Tudo isso nos leva as nossas próprias variações de linguagem.

Possenti (1996, p. 34) nos explica:

Um dos fatores que produzem diferenças na fala de pessoas são externos a língua. Os principais são os fatores geográficos, de classe, de idade, de sexo, de etnia, de profissão, etc., ou seja: pessoas que moram em lugares diferentes acabam caracterizando-se de falar de algum modo, de maneira diferente em relação a outro grupo.

Dessa maneira, não podemos perder de vista um ponto crucial que nos faz ser nós mesmos, com nossas peculiaridades e particularidades, que nos dão um respaldo e nos insere na sociedade como seres pensantes, como indivíduos cívicos com direitos e deveres, que nos torna parte de uma sociedade.


2 As variações no contexto sala de aula.

Claramente vemos dentro das escolas essas diferentes culturas em nossos alunos. Cultura essa que deve ser preservada para se preservar também o indivíduo, como um ser único e ativo dentro de uma sociedade.

A escola de hoje, diante dos vários problemas que nos atingem, seja como profissional na área da educação, seja como funcionário escolar, seja como aluno ou até mesmo envolvendo os pais dos alunos, parte integrante para o desenvolvimento na aprendizagem em casa, passa por uma fase de transição.

Sobre isso, Bagno (2002, p.16) nos mostra que:

A maioria dos professores que estão se formando agora já tem consciência de que não é mais possível simplesmente dar as costas a todas essas contribuições da lingüística moderna e continuar a ensinar de acordo com os preceitos e preconceitos da gramática tradicional. Por outro lado, ainda não sabem como concretizar essa consciência em prática de sala de aula.

Valorizar as diferenças lingüísticas existentes em sala de aula, não quer dizer que temos que deixar a gramática tradicional de lado, uma vez que é nela que estão às regras da norma, padrão de linguagem exigido pela sociedade desde tempos do descobrimento do Brasil.
No entanto, temos de levar em consideração que a gramática foi inventada pela Elite, ou seja, uma minoria da classe alta que julgava sua maneira de falar mais de acordo com o certo, e que outra maneira de se falar era considerado erro.

Equívocos de uma sociedade capitalista, que visa sempre o aprimoramento de sua própria classe social, sem ter em vista que o Brasil, não é Portugal, e que nosso país abrange várias culturas de diferentes partes do mundo, e que essas culturas fizeram e fazem parte da nossa vida, influenciando não somente nosso modo de falar, mas, nossos costumes e crenças.
Por tanto, não podemos descartar essas diferenças, porque não vivemos em um mundo onde tudo e todos são iguais, não existe somente uma classe, ou um estilo de vida, muito menos pessoas que pensam e agem de forma igual.

Bortoni-Ricardo (2005, p. 14,15) explicita:

A escola não pode ignorar as diferenças sociolingüísticas. Os professores e, por meio deles, os alunos, têm que estar bem conscientes de que existem duas ou mais maneiras de se dizer a mesma coisa. E mais, que essas formas alternativas servem a propósitos comunicativos distintos e são recebidas de maneira diferenciada pela sociedade.


Cabe a nós professores dar o passo inicial, para que essa valorização seja conservada, pois, é isso que faz de cada aluno, um indivíduo único na sociedade, e sabemos que hoje em dia, o papel da escola não está somente em ensinar os conteúdos programados para o ano letivo, toda a sociedade tem seu papel de importância na educação de nossos jovens, depende de nós fazermos nossa parte como cidadãos.

Na verdade, o que temos hoje em dia, é um desleixo muito grande ainda, a esse respeito, fala-se tanto em democracia, em direitos humanos e que o futuro está na educação, mas, se percebermos, a realidade nos mostra o descaso que ainda existe nas escolas, tanto dos próprios alunos, quanto ainda dos professores.

Orlandi (1996, p. 104) diz que:

O que se torna cada vez mais claro, levando-se em conta a heterogeneidade das línguas e seu caráter histórico, é que se deve repensar a relação entre o falar e o sistema de língua, percurso agora feito no sentido inverso: não como as línguas se deformam na sua realização, mas como chegam a se institucionalizarem as atuações da “fala”, isto é, como se chega a aceita-las comumente numa sociedade: como sua sistematização alcança certo peso próprio e como se podem modificar em novas situações [...].

Como educadores, e tendo em vista que cada dia os alunos precisam da escola, devido a várias situações contextuais que possam vir a passar (a começar pela família), percebemos que o papel do professor não está somente voltado ao ensino do padrão, têm-se que pensar o professor, como um “educador para a vida”.

Os alunos saem da escola (e até mesmo antes disso), e enfrentam as exigências de uma sociedade e se não atendem a essas exigências, são excluídos automaticamente dela.

De nada adianta ensinar e mostrar novos métodos de ensino aos professores em formação e àqueles que se formaram há pouco tempo, se isso não for divulgado e exposto à sociedade. Exigências são impostas a todos, independentemente da raça ou cor e até da idade, e nossos alunos percebem isso todos os dias, mas, não compreendem os “porquês” de muitas delas.
As variações lingüísticas, vistas e percebidas dentro da sala de aula, é um modo de aproximar os alunos com a realidade que os cerca, expondo as diferenças nas falas e na escrita, damos a oportunidade de diminuir o preconceito entre eles, e isso, pode ser um começo para aulas produtivas e significativas dentro e fora do contexto escolar.

Bortoni-Ricardo (2005, p. 133) nos esclarece levantando novamente o ponto de vista da sociolingüística que:

Muitos especialistas que têm examinado a luz da sociolingüística, as diferenças entre a norma culta do português brasileiro, cuja difusão é o principal objetivo dos currículos escolares de língua portuguesa, e a linguagem usada pelos educandos - e até mesmo pelos professores – têm apontado para a adoção de currículos bidialetais. Por contemplarem características da modalidade oral efetivamente usada nas escolas, estes currículos poderão facilitar a transição entre esta, e a variedade-padrão, nas suas modalidades oral e escrita.

Hoje, contamos com uma variedade de gêneros textuais incontáveis, dentre os quais temos não somente textos escritos, mas, também, textos falados. Outdoors, propagandas televisivas, anúncios de jornais ou até mesmo pela rádio, são gêneros onde encontramos a oralidade ou/e algumas variações na linguagem. Enfim, podemos contar com vários caminhos para se chegar ao ensino do português padrão, modalidade essa, ainda exigida, que deve ser repassada aos alunos.


3 A norma da linguagem culta.

O conhecimento da norma é uma maneira de se levar ao aluno parte de nossa história, e ao mesmo tempo levar a eles uma exigência ainda cobrada por uma sociedade presa aos resquícios de um passado, ou seja, o passado do nosso país.

Tendo em vista essa questão, percebe-se que a gramática ainda faz parte do contexto escolar, isso é sem dúvida uma das coisas que permanecerão nas escolas e não podemos fugir dessa realidade.

A pergunta que nos toma, então, é como introduzir a gramática dentro do contexto escolar, sem tornar as aulas cansativas e hipotéticas. Essa resposta vem com os novos métodos que aprendemos durante os anos de faculdade, levando isso em conta, é que se começa a pesquisar uma maneira de, não expor em sala de aula, mas, introduzir esses métodos aos professores, ainda agarrados ao tradicional “decoreba”, se bem que hoje, muitos professores já estão mudando sua forma de ensinar, o que facilita em termos de melhoria do ensino/aprendizagem a inserção desses métodos.

Música, teatro, vídeos, textos orais escritos, propagandas, e tantos outros gêneros textuais, fazem parte desses novos métodos, e isso aproxima ainda mais os alunos com a realidade que os cerca.

PCN’s (2000, p. 30) explicita que:

A importância e o valor dos usos de linguagem são determinados historicamente segundo as demandas sociais de cada momento. Atualmente exigem-se níveis de leitura e de escrita diferentes e muitos superiores aos que satisfazem as demandas sociais até bem pouco tempo atrás – e tudo indica que essa exigência tende a ser crescente. Para a escola como espaço institucional de acesso ao conhecimento, a necessidade de atender a essa demanda, implica uma revisão substantiva das práticas de ensino que tratam a língua como algo sem vida e os textos como conjunto de regras a serem atendidas, bem como a constituição de práticas que possibilitem ao aluno aprender linguagem a partir da diversidade de textos que circulam socialmente.

A utilização de diferentes textos aos quais os alunos ainda estão se acostumando a trabalhar no contexto escolar, é uma maneira de aprimorar seu conhecimento, não somente do padrão exigido pela sociedade, mas também, a se trabalhar melhor com questões do tipo, interpretações de textos, figurações, expressão de pensamento, e principalmente reflexão de textos, tanto os trabalhados em sala de aula, quanto seus próprios textos, auxiliando-os no desenvolvimento de sua capacidade crítica e interpretação, dentro e fora da escola.
Trabalhar com variados gêneros textuais é um indício do avanço que esperamos nas nossas escolas, para não somente formarmos alunos letrados, mas, capazes de viver em uma sociedade que cobra muito mais do que realmente oferece.


4 Considerações Finais.

Por fim podemos nos deter no centro das investigações até agora feitas para esse trabalho, levantando a questão do tradicional método de ensino ainda em vigor no contexto de sala de aula.
A esse fato (tradicionalismo), averiguamos a dependência de alguns professores ainda com a visão voltada ao passado, que sabemos não atingir os objetivos da escola, ou se atingem, percorre um caminho não muito agradável, a gramática, por muitos alunos, odiada por sua complexidade, o que torna seu estudo uma tarefa chata e nada divertida.

E quando falamos em “divertida”, não quer dizer que as aulas têm que ser sempre agradáveis, mesmo porque, aprender exige certo esforço, mas, dinamicidade é um bom caminho para se chegar ao aprendizado.

Ouvindo alguns boatos que percorrem a cidade, soubemos que a gramática está a ponto de ser abolida das escolas, pelo menos a gramática atual. No entanto, queremos deixar bem claro, que esse trabalho não trata de não aprendermos a gramática na escola, mas, ressaltar a indignação de ainda hoje convivermos com métodos tradicionalistas trazidos desde o descobrimento do Brasil; ressaltar a “fossilidade” que se dá ao ensino/aprendizado.

PCN’s (2000, p. 30) nos esclarece de modo específico à intenção desse trabalho:

Toda educação verdadeiramente comprometida com o exercício da cidadania precisa criar condições para o desenvolvimento da capacidade de uso eficaz da linguagem que satisfaça necessidades pessoais – que podem estar relacionadas às ações efetivas do cotidiano, à transmissão e busca de informação, ao exercício da reflexão.


Desse modo a valorização das variações de linguagem e da variação de suportes que tragam essas variedades no sentido de ensino/aprendizagem, é um tema discutido há muito tempo, o que nos leva a acreditar no aproveitamento e em um melhor desempenho no seu desenvolvimento intelectual, tanto no contexto escolar quanto na sociedade em que vive.

Referências
BAGNO, M.; GAGNÉ, G.; STUBBS, M. Língua materna: Letramento, variação e ensino. São Paulo: Parábola, 2002.
BORTONI-RICARDO, S. M. Nós cheguemu na escola, e agora?: Sociolingüística & Educação. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.
ORLANDI, E. P. A linguagem e seu funcionamento: as formas de discurso. 4. ed. Campinas, SP: Pontes, 1996.
POSSENTI, S. Porque (não) ensinar gramática na escola. São Paulo: mercado de letras: associação de leitura do Brasil, 1996.
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâmetros Curriculares nacionais: língua portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.

[1] Aline Patrícia Kovalski, Graduanda do curso de Letras – Português/Espanhol, da Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de União da Vitória - FAFI - PR.